Quilombo Aleluia Campos dos Goytacazes, Região Norte Fluminense
Do período anterior à abolição da escravatura até os dias atuais, a região do Imbé, situada no município de Campos dos Goytacazes, tem sido palco de variados atores sociais: africanos escravizados, negros aquilombados, colonos cortadores de cana, assentados de reforma agrária, missionários evangélicos e remanescentes de quilombos. Em 2005, as comunidades Aleluia, Batatal, Cambucá e Conceição do Imbé solicitaram à Fundação Cultural Palmares o autorreconhecimento como quilombolas.
Nessa região do Imbé, no Norte Fluminense, no 9º Distrito de Campos dos Goytacazes, ao todo, vivem, aproximadamente, 170 famílias, em um total de quase 750 habitantes. Em termos ecológicos, vale destacar que o território das comunidades está situado dentro do Parque Estadual do Desengano, unidade de proteção ambiental que tem o último remanescente florestal contínuo da Mata Atlântica. Certamente, em um espaço tão densamente ocupado, há diversas práticas culinárias interessantes
Luciana Delgado, de 39 anos, vive com a família na comunidade de Aleluia e começou a cozinhar aos 12 anos de idade, quando se tornara responsável pela criação dos irmãos em virtude da perda de sua mãe. Revisitando momentos difíceis e marcantes, Luciana fala sobre a alimentação durante a infância: “a gente passava tanto sufoco na vida que tudo que vinha para gente era bom”. Para tanto, serviu-lhe como referência a temporalidade da usina: “A gente vinha da usina lá... na época da usina, a gente fazia compras lá, e tudo que tinha lá de novidade pra criança a gente gostava. Não é igual a hoje, que as crianças têm tudo. Hoje as crianças tem tudo à mão. Iogurte, né? Minhas meninas têm quinze, dezesseis, dezessete anos, ainda compro iogurte pra elas, eu não tinha nada disso.”
Em um passado vivido com dificuldades, os vegetais existentes no quintal precisam ser largamente aproveitados para a sobrevivência. Entre eles, destaca-se o baiano, vegetal de coloração verde-escura que, de acordo com os costumes e hábitos da região, era preparado puro ou acompanhado. O baiano, como reforça Luciana, “tem muita vitamina”.
Atualmente, as pessoas ainda consomem o vegetal; porém, hoje em dia, há mais dificuldade para encontrá-lo, conforme Luciana adverte: “Olha, aqui [apontando para o quintal], na época a gente tinha o baiano. Já... eu não tinha tanta dificuldade [...] porque, às vezes, é difícil; hoje, eu achei na casa da minha irmã [...].”
Luciana, com orgulho ter superado os momentos difíceis do passado, conclui: “A gente gosta muito da nossa culinária. Tem gente que quer vir conhecer a área da gente, e a gente fica feliz. A gente tem pra oferecer a um turista, um colega, um amigo [...] antigamente não tinha isso, era muita dificuldade. E a gente gosta disso aí, é... de ver a família toda unida. Natal a gente reúne todo mundo. E a comunidade, graças a Deus, é todo mundo unido. Você vai fazer um programazinho ali, tá todo mundo conhecido... e no mais, a gente vai vivendo a vida da gente.”
Do angu com baiano, preparado por Luciana, sai uma fumaçinha que é um convite para experimentá-lo.