Quilombo de Baia Formosa Armação de Búzios, Região das Baixadas Litorâneas
Formoso: qualidade do que é harmonioso. As práticas culturais realizadas pelas pessoas que se autorreconhecem como pertencentes ao quilombo de Baia Formosa fazem jus ao nome. Atualmente, o grupo vive fora do território original onde habitaram os antepassados e tem tornado visível, por meio de cirandas e caxambus, o patrimônio cultural que receberam deles.
Em 2011, a comunidade recebeu da Fundação Palmares a certidão de autorreconhecimento como quilombola. Entretanto, as 60 famílias cadastradas ainda vivem fora da área-alvo da titulação, haja vista que os quilombolas estão em um processo de reivindicação territorial em face do atual proprietário da fazenda. Nesse contexto, a culinária constitui-se como elemento central para suturar as relações entre as pessoas e a terra.
Na entrevista com Elizabeth Fernandes Teixeira, liderança do quilombo, entrevemos uma diversidade de alimentos que compõe o repertório culinário do grupo. Em Baía Formosa, as sonoridades da cozinha e do quintal são mescladas, o que é representado prototípica e exemplarmente pela cocada de mamão. Ao ser interrogada sobre as tradições culinárias, Beth, como também é conhecida, responde sem titubear: “A gente lembra muito da cocada que a minha vó fazia: cocada com coco e mamão, que era uma delícia, né?”
Tal qual o mamão, os ingredientes utilizados nas antigas receitas estavam disponíveis no território por meio da agricultura. Hoje, a prática é ameaçada devido à perda das terras pelo grupo, conforme relata Beth: “Hoje, a gente tem um local aqui onde nós moramos; lá, não tem tanto espaço pra plantar, e antes aqui tinha espaço. Nós nascemos aqui [Baia Formosa], [...] aí fomos expulsos pelo fazendeiro de não poder ficar morando. Ou você morria, né? Ou você escolhia sobreviver. Então, nós escolhemos. Meu pai escolheu sobreviver. Meu vô, são dez irmãos, né? Minha mãe foi mãe de dez filhos, e ela escolheu levar a gente daqui. E todo mundo saiu, e hoje a terra é vazia aqui em Baia Formosa... terra vazia, e nós estamos reivindicando essa terra pra que possamos ter o direito de voltar.”
Certamente, as dificuldades de permanência do grupo no território e as transformações históricas favoreceram algumas mudanças. De qualquer forma, a alfavaca com sabor e aroma marcantes permanece com uso inalterado. Assim, com bastante entusiasmo, Beth revela e reforça: “E uma das coisas que a gente sempre tem pelo menos plantado no nosso quintal é a alfavaca [...] porque quando você coloca uma carne, um frango com aipim, com bastante alfavaca, é tudo! Alguém passa na rua, chama a atenção é o que dá o diferencial [...] o
tempero da roça tem que ter alfavaca.”